Cartas


26/03/2012

Culturas

Uma das vantagens de se vir viver para um país tão longínquo, diferente e que é um grande destinho de emigração é a exposição a outras culturas que temos. Já viajei por muitos, muitos países e posso dizer hoje que só mesmo vivendo no país podemos aperceber-nos de quão diferentes são as outras culturas quando comparadas com a nossa. Os australianos, já aqui o disse, não existem. Ou são australianos com pais chineses, ou australianos com pais indianos, ou australianos com pais italianos, ou australianos com pais portugueses e por aí fora. Isto faz com que existam aqui muitos hábitos e muitas de formas de estar distintas.
Por motivos de trabalho tenho muito contacto com indianos. Aliás, o meu melhor amigo desde que cá cheguei é indiano e vive cá há apenas 3 anos. Apesar de sermos muito próximos, este é um tipo de amizade que nunca experimentei. Há um "cultural gap" entre nós que por vezes nos leva a rir à gargalhada por outras nos leva a pedir desculpas um ao outro, bom mais eu a ele do que o contrário. 
Isso aconteceu na semana passada. Há 3 anos que ele não ia visitar a família na India e foi em Fevereiro tendo ficado lá o mês todo. Quando regressou dei-lhe um abraço e perguntei como tinha corrido a viagem. E ele disse: "Very well, i'm engaged!" e mostrou-me um anel de ouro gigante.  Eu não quis acreditar e claro fiquei o dia todo a partir-lhe a cabeça. É que esta menina da qual ele ficou noivo foi-lhe arranjada pela mãe e quando lhe perguntei se estava apaixonado por ela, respondeu que um dia iria estar. Lá lhe expliquei que casar com alguém que não se ama pode ser um grande erro, mas ele disse que na cultura dele era assim e que a mãe ia ficar mais descansada. Afinal ele já tem 27 anos, já devia estar casado há muito tempo. 

Confesso que tenho encontrado aqui várias diferenças culturais que me fazem espécie, mas as que mais me intrigam são as indianas e as que mais me incomodam as chinesas. 
No fim de semana a trabalhar no hotel conheci uma hóspede indiana. Uma contabilista que está cá com tudo pago a fazer um training de uma semana e que nunca saiu da India antes. Eu e a recepcionista encorajámo-la a ir à city conhecer Darling Harbour e Circular Quay no Sábado. Estava um dia lindo. Eu ainda lhe escrevi num papel as indicações todas que ela precisava saber. No Domingo perguntei-lhe se tinha gostado. Disse-me que não tinha ido porque estava sozinha e sozinha não podia ir. Não sei se não podia ir porque lhe faltava a companhia de um macho, se não podia ir porque não gostava de andar sozinha na rua ou se não podia ir porque tinha medo que a cidade não fosse segura o suficiente. Sei que não foi. Ficou o dia todo no hotel, tirei-lhe uma foto na recepção e parece que ficou o resto da tarde a dormir ou a ver tv. 

Estive a reflectir sobre isto e pensei que aquilo que me ensinaram em Antropologia -  que não há culturas boas ou más - não é de todo verdade. Há, na minha singela opinião, aspectos culturais que não são positivos. Que castram a auto-suficiência de cada um, que cortam a possibilidade de sentirmos coisas maravilhosas, como por exemplo, casar apaixonado. Haverá também este tipo de coisas a apontar à cultura ocidental...enfim, a perfeição não existe. Mas olho para a minha vida, para a mim enquanto individuo e, cultural ou não cultural, agradeço aos meus pais terem-me criado para ser independente e auto-suficiente. E acredito que não me poderiam ter incutido nada melhor do que isto.



4 comentários:

Um pai que não sabe o que faz disse...

Quando estive em Moçambique, senti exactamente o mesmo que sentes, secalhar exponenciado por estar numa realidade tão diferente da minha não só em termos culturais, como em termos de desenvolvimento. Também tinha uma noção de que a cultura reinante lá tinha muita coisa errada que precisava de mudar.

No entanto, ao final de um ano lá, já não tinha assim tanta certeza. Estive nas mesmas aulas de antropologia que tu :), mas acho que não há de facto culturas boas e más. O que há são coisas que não entendemos e, por isso, com as quais não concordamos. Depois, há aquelas que passamos a entender e com as quais continuamos a não concordar :) No entanto, há também nessas culturas coisas muito mais maravilhosas do que nós temos na nossa própria cultura ocidental, que, como dizes, está longe de ser perfeita.

A cultura adapta-se à realidade da vida de cada um, e cada um deve adaptar a sua vida à cultura em que vive. Nunca serás feliz querendo ser solteira numa sociedade onde o casamento é essencial, como nunca serás feliz numa cultura que despreza os valores da família e tudo faz para prejudicar a família, se tu tiveres o desejo de ter uma famílias.

Cada um deveria ser livre de escolher a cultura que quer seguir, aquela que o leva à felicidade. Não podemos é partir do princípio que os outros serão felizes da mesma forma que nós somos. Esse teu amigo pode ser muito feliz com a opção de casar por arranjinho dos pais, por muito que isso possa causar incompreensão e espanto a ti, ou a mim. Essa é a beleza da natureza humana, a forma como conseguimos, de maneiras tão diferentes, atingir uma felicidade que todos procuramos... :)

Isa disse...

São muito loucas essas diferenças. eu estive na índia e vou-te dizer nao tem graça nenhuma. o que mais me choca na cultura deles, para além de comerem com as mãos, é as castas. tu nasces sapateiro e podes ser um einstein em inteligência e seres sapateiro o resto da vida. por outro lado, se és de uma casta alta, podes vir a ser hospedeira só pq o teu pai é rico e fazeres um serviço de merda e nao seres mandado pra rua. a índia traumatizou-me :)

Cate disse...

Credo.

Mas a verdade é que para eles isso é normal e, por sempre ter sido assim, é que eles conseguem ser felizes na mesma. Suponho.

Unknown disse...

Paquis e Indianos é complicado... mais do que os muçulmanos por incrivel que pareça, mas de facto viver em cidades cosmopolitas tem destas coisas, melting pot cultural cria um certo distanciamento acho eu